Evento
SÁBADO 13 NOVEMBRO, 16H00
WHO
Trio
Michel Wintsch piano
Gerry
Hemingway bateria
Bänz Oester contrabaixo
Um dos traços
distintivos da história da música popular ocidental do século XX, e as origens
do jazz são em si mesmas a expressão deste princípio, é o da crucial influência
exercida pelas margens sobre o centro. Na era da massificação, a criação
artística democratizou-se, tornando-se desta forma incontrolável, no sentido em
que passou a favorecer formas de expressividade espontâneas e desclassicizadas,
ou seja, finalmente livres dos constrangimentos do classicismo da academia.
Praticamente todos os géneros musicais modernos – rock, hip-hop, funk e todas
as suas derivações – constituem expressões culturais não-institucionais
(marcadamente urbanas) que foram absorvidas pelo sistema económico. Se
aceitarmos esta interpretação, acabamos por concluir que, em certo sentido, a
narrativa sonora do século passado é uma história de rumores subterrâneos que,
sendo considerados ou ultrajantes ou incompreensíveis no momento que aparecem,
acabam quase inevitavelmente por, mais tarde ou mais cedo, se afirmar como
tendências dominantes no sistema económico-cultural.
Nos últimos trinta
anos, tornou-se convencional na crítica musical a distinção clara entre duas
grandes correntes na arte contemporânea: a corrente principal (mainstream)
e a corrente marginal (underground) – ou, por outras palavras, a arte
que produz valor económico e a arte que recusa esse sistema de monetarização do
ato criativo. O WHO Trio cabe naturalmente nesta segunda e mais difusa
categoria de músicos intransigentemente anti-económicos mas cujas ideias
começam a invadir o meio institucional do jazz, agora tolerante à
improvisação livre e à exploração de largo espectro. Composta por três músicos
de excelência, esta formação é uma das pioneiras do movimento de reconexão
espiritual entre o radicalismo formal e a tradição, propondo assim uma terceira
via entre o free jazz dos anos setenta e as tendências de fusão dominantes nas
décadas de 1980 e 1990.
Na música altamente ressonante deste trio, a
matriz original do jazz é invocada de forma expansiva numa constante procura de
novos horizontes entre composição e improvisação, balançando permanentemente
entre a dimensão individual e a dimensão coletiva do gesto de criação musical.
A sua identidade é inseparável do estilo dos seus intérpretes, três músicos com
uma abordagem altamente física ao seu instrumento: os suíços Michael Wintsch
(piano) e Bänz
Oester (contrabaixo), dois
nomes importantes da improvisação europeia, e o norte-americano Gerry
Hemingway, membro dos BassDrumBone e colaborador, entre muitos outros, de
figuras seminais do jazz como Anthony Braxton ou Cecil Taylor. O projeto mais recente
dos WHO, “Strell”, e que estará previsivelmente no centro do concerto no
Guimarães Jazz 2021, é dedicado à reinterpretação do legado musical de Billy
Strayhorn e Duke Ellington, dois nomes fundamentais da música popular do século
passado e cujo legado continua a exercer uma influência inegável sobre a
criação musical contemporânea. Simultaneamente tenso e delicado, abstrato e
orgânico, sempre focado na dimensão interativa da música, o som deste grupo
destaca-se sobretudo pelo trabalho de descoberta de novas gramáticas a partir
de linguagens antigas, novas palavras que ecoam no nosso tempo e cujo rumor
começa agora a ser escutado.